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Terra de Maria Rosária, a Rainha Negra que abalou o mundo.

por Juliano F. Teles

Aspectos monteazuleses de 1908, sob a ótica de Antonino da Silva Neves e reescrito por Narciso Gonçalves Dias em 2008.
As notícias do Município de Boa Vista do Tremedal, na Província de Minas Gerais, posteriores a 1800 são um tanto obscuras, nada de sabe sobre as entradas de estranhos pelas terras tremedalenses que pertenciam ao domínio da Casa da Ponte, não se precisando bem as condições e modo como desenvolveram o povoamento primitivo de Tremedal. As tradições orais são vagas e as escritas são desconhecidas. O Sertão de Tremedal era um ambiente hostil por natureza, não era abençoado por minas de riqueza desejada pela Corte Real e nem dispunha de grandes bacias hídricas que justificasse a ocupação pelos nobres que tinham à sua escolha, terras mais nobres. Temos caso como o Sítio do São Pedro, que era arrendado em 1800, a 20 tostões anuais, ou seja, era como se fosse uma afirmação da baixa produtividade das terras tremedalenses. Nossa região era vista como um deserto, inóspito e selvagem, pois os indígenas foram escorraçados da orla marítima e adentrando cada vez mais aos Sertões, à medida que os conquistadores os localizavam, eram caçados em bando para domesticação e os que conseguiam fugir iam adentrando cada vez mais rumo ao Norte de Minas, refúgio seguro, pela ausência do homem branco na região. A confirmação da presença indígena em Tremedal se faz com a descoberta de vestígios na região da Serra Ginete, que coabitaram com Maria Rosária Pereira da Rocha e seus comandados na implantação da Fazenda de cria de gado e abertura de fronteiras agrícolas. Nota-se que os primeiros estabelecimentos foram nas vizinhanças dos aldeamentos indígenas, ao menos de sítios onde ainda hoje se encontram vestígios da estada dos bugres. Assim é que Tremedal fica a em frente da Serra Ginete, a Melada fica a meia légua da Aldeia Indígena (vejam que em 1908 os índios habitavam nossa região) pertinho da Pedra Vermelha e o povoado de Aguilhadas fica perto do Gentio. Graças à orientação do Conde da Ponte, que teve a visão progressista de colonizar as terras do Sertão do Rio Pardo de Minas, Urubu e Caetité, enviando portugueses e africanos a estabelecer fazendas de gado e de lavouras em lugares apropriados acompanhados de padres jesuítas encarregados da catequese dos índios; isso ainda na segunda metade do século XIII. Quando se deu a criação de um livro geral de Tombamento de terras o qual, existiu até pouco tempo para lançar jorros de luz sobre a escuridão da noite que envolve a História do Tremedal antigo, isto é antes do primeiro quartel do século XVIII, em que as trevas do passado começam a se desfazer. O meu amigo Daniel Antunes Júnior, em sua bela Fazenda em Espinosa, nos meus tempos de fiscal da carteira rural do Banco do Brasil, sempre me contava que o referido Livro do Tombo, teve seus últimos dias em mãos do Padre Guilhermino, homem de grande visão história e sabia do valor do Livro, mas foi iludido pelo Capitão Donato Gonçalves Dias, que pediu o Livro para dirimir algumas dúvidas sobre limites de terras e foi a última vez que se viu o elucidador livro que continha toda a história da formação de Tremedal. O Capitão Donato não devolveu o Livro do Tombo e em gargalhadas o Daniel me contava que fora o primeiro tombo de vulto que o Padre Guilhermino levou e sentiu prá valer. O sentimento maior foi para o povo monteazulense que se viu privado de valiosas informações.
Mas um outro amigo meu, Coronel Antonino da Silva Neves, esse eu não tive o prazer de conhecer pessoalmente, apenas sei dele pelos seus escritos em 1900 a 1910, de sua morada em Espinosa, com a sua mãe sendo proprietária do Sítio Sant’Ana. Que nos conta em sua Coreografia de 1908 que os primeiros estabelecimentos no município de Tremedal foram os desbravadores Maria Rosária e o português Pompéo (Tremedal) e Ana Maria de Brito (Mocó).
No Distrito de Lençóis do rio Verde: Manoel Afonso de Siqueira, estabelecendo-se na Melada e Dona Tereza Nunes de Siqueira, na Vargem do Curral, O Sr. Antonio Martins de Melo e Cyriano Nunes de Siqueira no Sítio Rio Verde; José Gonçalves Veira na Várgem da Faca; Salvador Pereira dos Santos no Sítio Moleque; Francisco Caetano e o tenente Bernardo Antonio de Figueiredo nos Macacos; Rita Nunes, no Sítio Jacaré e Francisco Ribeiro da Rocha no de Sant’Ana.
No distrito de Mamonas o alferes José Nunes ocupava o Sítio Taboleiro e o Capitão Francisco da Costa Meira ocupava o lugar Mamonas.
No Distrito do Pernambuco, Dona Maria Ribeiro da Conceição ocupava o Sítio Riacho de São Pedro.
No Distrito de Mato Verde e Bonito, o Senhor Manoel Luiz Ferreira ocupava o Sítio Cana-brava; Francisco Fernandes Guimarães e seu irmão João Fernandes Ribeiro o Sítio Pageú. No Distrito de Brejo dos Mártires: Wenceslau Alves ocupava as Barrigudas de Baixo, no Rio Verde.
Pedro Francisco de Castro, procurador geral de Sua Majestade, em escrito juramentado, redigido na Bahia, para normalizar a posse das terras no Sertão Norte Mineiro: “… reintegrado plenamente na livre administração dos bens vinculados e dos imóveis próprios de sua casa, em resultado da Carta Régia de 17 de junho de 1818, obtendo juntamente a licença de Sua Majestade para transportar a esta Cidade afim de regular com melhor conhecimento de causa o Plano Administrativo dos mesmos bens e dependências, e acerca de vender os imóveis da classe silo diais já deferido por Acórdão do Juiz Privativo de 23 de setembro de 1817 para se arrematarem em Praça do mesmo Juízo. a qual deposição não tem progredido em razão das remotas distâncias desta Capital aos Distritos em que os imóveis se acham situados, sendo os licitantes mais aptos para estas compras os Arrendatários que nelas residem; desejando, porém que estas transações sejam o mais breve possível efetuadas com o menor incômodo e despesa dos Compradores, deliberou o seguinte:
Que o Administrador e Procurador Geral fazendo extrair listas do Livro 1º do Tombamento em que se acham escriturados os imóveis arrendados ou devolutos situados em cada um dos Distritos, eleger Procuradores de conhecida probidade, substabelecendo os poderes com que ele lhes é autorizado para vender.
Que o procurador substabelecido em qualquer dos Distritos proceda na venda dos imóveis à sua incumbência intimando primeiro ao Arrendatário para comprar a terra de que paga renda, com a preferência a qualquer outro pretendente, assinando prazo de tempo certo, conforme as circunstancias que representar das quais fará assinto em Memorial separado em dia, mês e ano.
Enquanto decorrer o prazo conferido ao rendeiro para a compra da terra que se lhe ofereceu, passará novo arrendamento no Livro que para isso é agora consignado e o preço da renda anual não seja menos de quatro a cinco por cento contando sobre o valor do imóvel, declarado na lista ou Livro 2º do Tombamento da respectiva Divisão.
Por esse tempo contavam-se obra de quarenta enfiteutas no atual território deste Município de Tremedal então compreendido no Sertão do Rio Pardo de Minas. Entre outros, no atual distrito da Cidade: Antonio de Macedo Portugal no Riacho Seco; Manoel Dias Correia em Sant’Ana; Dona Anna Victória da Conceição em Santa Cruz e Espírito Santo; Antonio Ferreira de Souza no Rio Abaixo; Joaquim Alves Martins no Barreiro Grande; Manoel Antonio Correa de Brito no Bonsucesso; Nos Distritos de Bonito e Mato Verde, o Sr. Roberto Fernandes Jácome ocupava o Bonito; o Sr. João Fernandes Guimarães o Jacuípe. No Distrito do Pernambuco: Antonio Fernandes Guimarães ocupava o São Pedro. Este Sítio foi vendido a Vasco Antonio de Siqueira e seus irmãos por R60$000(Sessenta mil réis). O arrendatário pagava dês tostões anualmente. Continha meia légua de comprimento e uma légua de largura, no valor de 36$00 em 1807. No Distrito de Lençóis; Rosa Maria de Jesus ocupava o Sítio San’Ana; Domingos Francisco Rodrigues a Vargem da Cachoeira, terreno este vendido parte a Theodózio Gonçalves Siqueira por R10$000 (Dez mil réis) e a outra parte foi arrendada a Francisco José Correa. Francisco Alves Martins ocupava a Porteira Velha; Francisco Ribeiro da Rocha ocupava o Trombeteiro; Lourenço Afrânio de Siqueira a Tapera, que foi vendido a Manoel Tavares dos Anjos e mais cinco sócios por R36$000 (trinta e seis mil réis); Manoel Nunes de Siqueira ocupava o Santa Ana; José Ledo da Ponte, a Vargem Redonda, que foi vendida a Maria Ledo da Ponte; Antonio Fernandes Ribas o Taboleiro, que foi vendido a Cypriano Ferreira da Silva; João Soares Barbalho ocupava o Sítio Lençóis, que foi vendido a Manoel Ribeiro da Cunha e outros. Manoel Ferreira de Lima ocupava o Mingu; Raimundo Carvalho Falcão o do Riacho da Lagoa; José Ribeiro da Cunha o Itom; Lourenço Barbosa de Castro o São Domingos-Mingu, que foi avaliado em 240$000(duzentos e quarenta mil réis, contando com légua e meia de largura e duas léguas de comprimento, com renda anual de R3$000; Florêncio Fernandes Guimarães o de Santo Antonio do Pé de Serra vendido ulteriormente para Bernardo José Pacheco; Izidoro Cardoso da Silva o Jacaré, sendo a metade do sítio vendido a João Damasceno de Sá e a outra metade a José Nicolau Tolentino; João Teixeira Barbosa o de Santa Ana; Tomaz de Aquino de carvalho o de Cachoeirinha; Valério da Costa Ramos a Ilha da confluência do São Domingos com o galheiros; No Distrito de Mamonas, Francisco Xavier da Silva em Santana do Riacho Seco. No Distrito de Brejo dos Mártires: Dona Rita Josepha Brandão ocupava o Juazeiro, Antonio Moreira Parafita ocupava os Mártires, que foi vendido a José Antonio Teixeira por um conto de réis; João de Araújo Moreira ocupava as Piranhas e Josepha Maria de Jesus o sítio Canabrava.
Todos os sítios tinham limites mais ou menos assinalados e sua grandeza territorial não era uniforme. Um dos maiores em extensão territorial era o Sítio de Morrinhos, região de Trás da Serra, de seis léguas de comprimento e duas léguas de largura, no valor de um conto de réis em que João de Araujo Moreira pagava renda anual de quarenta mil réis. E um dos menores era o de Sant’ana de Raimundo Carvalho Falcão que pagava anualmente a renda de duzentos e cinqüenta réis, continha de comprimento e de largura um quarto de légua pouco mais ou menos, no valor de dez mil réis; mais de dez sítios tinham a denominação de Sant’ana. A maior força desses arrendamentos ocorreu entre 1800 e 1810, sobretudo entre 1806 e 1808.

Solo apropriado a todo o gênero de cultura e para o desenvolvimento da criação, clima salubérrimo, florescimento das fazendas primitivas já eram sentidas no último quartel do século XVIII, quando teve lugar a derradeira missão do Frei Clemente, um dos acontecimentos mais notáveis do antigo Tremedal 1790-1810.
Maria Rosária com a idéia da fundação de um arraial doou à Senhora da Graça o terreno em que está a cidade da Boa Vista: foi essa a primeira povoação.
A aurora do décimo nono século assistiu as primeiras edificações do Tremedal, surgindo pacificamente do solo úbere e salino do vale das Cordilheiras. É bem possível que a fundação de Tremedal remonte ao fim do século XVIII. Veja-se Notícia História do distrito da Cidade.
Em 1809 houve a primeira grande seca do século XIX, fenômeno desolador que se tem repetido periodicamente de dez em dez anos, precedido sempre por anos abundantíssimos de chuvas.
Em 1819 o território do atual município era já bem povoado, sobretudo os vales dos rios e cortado por estradas que cruzavam em diversas direções. Nesse ano houve forte estiagem acompanhada de carestia de víveres.

Fonte: Narciso Gonçalves Dias

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